sexta-feira, 19 de março de 2010

Combate à corrupção exige novo código penal


2010

Combate à corrupção exige novo código penal


Se um agente público recebe cheque de uma empresa, deposita-o em sua conta pessoal e depois o órgão em que está lotado assina um contrato com essa empresa o crime de corrupção não está provado. Para isso, seria preciso provar a intenção de corromper. Cláudio Weber Abramo, diretor-executivo da Transparência Brasil, organização dedicada ao combate à corrupção, credita a esse capítulo do Código Penal uma das principais lacunas da legislação brasileira no combate à corrupção. “É preciso reformar o Código de Processo Penal e tipificar os crimes por suas evidências materiais”, diz.

Aos 63 anos, boa parte dos quais dedicados ao jornalismo, Abramo não poupa a imprensa - pela displicência na fiscalização do poder local, hoje responsável pela execução do orçamento público -, defende a Lei de Licitações brasileira (”uma das melhores do mundo”) e diz que um dos poucos avanços no combate à corrupção é a Controladoria-Geral da União (CGU), criada no governo Fernando Henrique Cardoso e fortalecida no governo Luiz Inácio Lula da Silva. A seguir, a entrevista concedida ao Valor:

Valor: Em que medida as punições já existentes, relativas à corrupção, são aplicadas? O projeto de lei encaminhado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva resolve a questão?

Claudio Weber Abramo: Essa iniciativa não terá consequência prática. O problema com o combate à corrupção, depois de descoberto, no Brasil, não tem a ver com o tamanho das penas. As punições estão previstas. Mesmo aqueles que já estão capitulados na legislação como crime hediondo, o crime ambiental, por exemplo, não levam as pessoas a sofrerem as consequências às quais estão enquadradas, não levam os acusados a serem detidos sem fiança ou terem sua prisão temporária prorrogada. Existem condicionantes. Tem de ser preso em flagrante, por exemplo. Aumentar a punição nem sequer arranha a resolução do problema.

Valor: Qual a maior dificuldade ao aplicar punições?

Abramo: Para que o sujeito seja condenado é preciso provar a intenção, algo de natureza subjetiva. Veja só: se um agente público recebe um cheque de uma empresa e o deposita em sua conta pessoal, sendo que depois essa mesma empresa assina um contrato de serviços com o órgão público, isso prova corrupção? Negativo. É preciso provar a intenção, algo que não se prova. O sujeito pode alegar que foi um empréstimo, qualquer coisa do tipo. Condenar alguém por corrupção no Brasil é impossível. Mesmo que acabem as possibilidades de recursos, o sujeito é inocentado por falta de provas de intenção.

Valor: Que mudanças seriam necessárias então?

Abramo: Precisa reformar o Código de Processo Penal e tipificar os crimes por suas evidências materiais. É uma sociedade dividida em pobres e ricos e isso se reflete no sistema penal. Eu estava presente ao evento no qual o Lula falou a respeito. O problema é que a medida não reduz a incidência de casos em que o sujeito se mete em um caso de corrupção e não é condenado. Para isso existem causas objetivas, que estão no Código de Processo Penal, onde existem inúmeras oportunidades para que o réu apresente recursos protelatórios de todo o tipo, então quem tem dinheiro para pagar advogado caro, fica protelando para sempre. É o que acontece com esses ladrões que vão trabalhar no setor público.

Valor: A Lei de Licitações que temos é suficiente para coibir desvios de verba pública?

Abramo: As regras precisam ser aplicadas. As condições de aplicação têm a ver com mecanismos administrativos, de controle e, no caso da legislação de licitações, com o ordenamento do mercado. A Lei de Licitações brasileira é uma das melhores do mundo. Quem é contra [a lei] são os agentes públicos, que querem decidir a coisa com a sua própria cabeça, o que aumenta a corrupção brutalmente, e as grandes empresas, que querem levar os contratos sem participar de concorrência. Só que a lei, por si só, não resolve o problema, ela dá as condições para isso.

Valor: Os leilões eletrônicos são um mecanismo confiável?

Abramo: O leilão é só um mecanismo. O que importa são as condições de participação. Como se direciona, se frauda uma licitação? Uma série de condições de natureza financeira, econômica, fiscal e técnica. Além da formação de cartéis, onde as empresas combinam que só uma delas cumprirá as condições necessárias. Depois, passa a vez a outra, num sistema de carrossel. Para não perder dinheiro, essas empresas que entram na disputa para perder deixam na mão da ganhadora a elaboração de todas as propostas. Isso pode ser identificado examinando o texto das propostas, que muitas vezes usam até termos parecidos. O importante dos leilões eletrônicos é que eles permitem a participação de empresas que não são daquela cidade, daquele estado, diversificando. Isso rompe o cartel.

Valor: A imprensa tem feito seu papel na fiscalização das verbas públicas?

Abramo: O Brasil é um dos países mais descentralizados do mundo. Os municípios têm completa autonomia para planejar, executar e controlar seus orçamentos. No entanto, 80% deles dependem dos repasses da União do dos Estados para sobreviver. Em metade deles, esse repasse corresponde a 90% desse orçamento, porque não há produção de riqueza local. Muitas vezes, esse dinheiro se perde e a questão nem é só a corrupção, é ineficiência, incompetência para controlar esse dinheiro. A imprensa, nesse sentido, também não faz o seu papel, porque a cobertura local é muito pequena, desinteressada, sendo que é nos municípios que grande parte dos recursos é gasto.

Valor: Entre o governo atual e o anterior, quais as diferenças no tocante à transparência no serviço público?

Abramo: Durante o governo Lula, houve um processo de fortalecimento dos instrumentos de controle relativos ao Executivo federal, centralizados na Controladoria-Geral da União, criada no governo de Fernando Henrique Cardoso, no fim de 2001. Não houve naquele momento, tempo para ser utilizada (era o fim do mandato de FHC). No governo Lula teve um fortalecimento grande, com a contratação de funcionários e atuação efetiva. Passou então a ter uma atuação preventiva, alterando decretos que regulavam a assinatura de convênios, estabelecendo condicões a serem seguidas por Estados, municípios e ONGs ao firmar convênios com a União.

Autor: Vandson Lima
Valor Econômico - 04/01/2010

4 Respostas para “Combate à corrupção exige novo código penal”

  1. Silvio Miguel Gomes diz:

    Assim que assumiu o poder o ex-Pres. FHC extingiu a Comissão de Investigação para combater a corrupção, composta por integrantes da Sociedade Civil. A Controladoria Geral da União foi criada em 2001 porque havia a possibilidade da criação de uma CPI contra o Governo FHC. Foi uma forma de abafar.

  2. amanda diz:

    a corripçâo esta presente em muito estados entre politicos as regras devem ser aplicada e a onde fica as proposta dos politicos

  3. Ricardo Adv. diz:

    Dr. Carlos Zamith,

    Sugiro mais posts sobre a corrupção policial, como aquele extraído da revista Veja, bem como de pessoas que são vítimas de abuso de autoridade, extorsões e outros crimes praticados por policiais sejam civis ou militares.

  4. Jose diz:

    Dr. Carlos.

    O problema da corrupcao eh cronico, esta disseminado na sociedade desde a nossa origem como colonia de Portugal e continuara por muito e muito tempo, pois nao existe vontade real para acabar com esse mal que assola a sociedade.
    Os sinais de corrupcao estao visiveis em todos os lugares, principalmente nos meios policiais e ninguem toma qualquer providencia.
    Vejamos um exemplo:
    Se um representante do ministerio publico for ao estacionamento que fica em frente ao Depatri em Sao Paulo, onde todos os investigadores, agentes e delegados estacionam seus veiculos ficara surpreendido com o numero de carros de luxo e de importados ali estacionados.
    Se a investigaca for mais apurada, verao que a maioria dos policiais que ali trabalham possuem carros que jamais poderiam ter com o salario que ganham.
    Se a investigacao for mais adiante, veremos que esses policiais possuem casas luxuosas, sitios, casas de praia cujo montante somado nao seria possivel amealhar com uma vida inteira de salario sem gastar um unico centavo.
    Um outro exemplo eh a violencia que esta totalmente institucionalizada no pais.
    A orientacao para a populacao eh nao reaja, nao tenha armas em casa nao faca nada. Deixe o ladrao trabalhar sem qualquer risco.
    A quem interessa a violencia desenfreada no pais?
    Evidente que isso so interessa aos donos de Empresas de Seguranca que lucram mais e mais ano apos ano com o aumento da criminalidade.
    E quem sao esses donos de empresa?
    Policiais e Politicos, ou seja, novamente a corrupcao criando loobs para que o estado nao tenha reais condicoes para reverter o caos.
    Ja pensou se a violencia ai no Brasil atingisse os niveis daqui dos EUA onde moro?
    Seria a falencia de muitos poderosos.
    A corrupcao esta ligada diretamente ao poder.
    Aqui nos EUA nao necessitamos temer a violencia, pois a policia eh ativa e eficaz para proteger o cidadao, nao obstante praticamente 90% da populacao possuem armas de fogo em casa para protecao da sua familia.
    Concluindo, a corrupcao no Brasil esta disseminada em todos os ramos da sociedade tal qual um polvo com seus tantaculos.
    Ainda bem que o Judiciario parece ser uma instituicao onde a corrupcao se descoberta eh punida exemplarmente.
    Nao vejo sinais de melhora no horizonte, enquanto perdurar a maxima do individualismo brasileiro.
    Apenas com investimentos em educacao conseguiremos a longo prazo reverter esse mal.


Acusado de tentar subornar testemunha quer mesmo tratamento dispensado a Arruda


Brasília – Os advogados do ex-diretor da Companhia Energética de Brasília (CEB) Haroaldo Brasil de Carvalho, preso preventivamente por tentar subornar uma testemunha do esquema de corrupção no Distrito Federal (DF), entraram hoje (18) com novo pedido de habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF) para que seja concedida prisão domiciliar ou as mesmas condições oferecidas ao ex-governador José Roberto Arruda (sem partido).

Haroaldo teve a prisão preventiva decretada junto com Arruda e outras quatro pessoas acusadas de tentar corromper uma testemunha da Operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal.

A defesa alega que Haroaldo, embora seja portador de diploma de curso de nível superior, não está preso em cela especial. Ao contrário, sustenta, está em uma “masmorra”. Lista ainda os benefícios a que Arruda tem direito, como visita diária da esposa, alimentação especial e atendimento médico, enquanto Haroaldo vive “situação de constrangimento pessoal”.

Em 11 de março, o ministro do STF Marco Aurélio Mello negou recurso do ex-diretor da CEB, no qual ele pedia o arquivamento da ação penal sobre a tentativa de suborno. No pedido, os advogados alegaram que a ação fora aberta pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) sem a necessária autorização da Câmara Legislativa do Distrito Federal para processar o governador, como determina a Lei Orgânica do DF. Esta seria condição essencial para a abertura do processo. A sua falta, para a defesa de Haroaldo, representa inobservância ao devido processo legal e torna nulo o ato de notificação dos investigados.

Contudo, para o ministro Marco Aurélio, a licença prévia da Câmara Legislativa não abrange a fase das notificações. “A licença prevista na Lei Orgânica do Distrito Federal está ligada à deliberação sobre a denúncia, quando então é possível vir a ser instaurada a ação penal. A fase relativa à notificação é prévia e visa a aparelhar o processo para chegar-se ao momento crucial – o de receber-se, ou não, a denúncia”, disse o ministro na decisão anterior.

Julgamento de vereadores cassados de São Paulo é adiado


Repórter da Agência Brasil

São Paulo – O julgamento dos recursos dos vereadores de São Paulo cassados em primeiro grau, em outubro de 2009, Carlos Alberto Apolinário (DEM) e Gilson Almeida Barreto (PSDB), foi adiado hoje (16), pelo juiz Jeferson Moreira de Carvalho, que pediu vista do processo. A suspensão ocorreu depois dos vereadores terem recebido três votos favoráveis. No total, sete juízes votam.

O Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) havia marcado para esta terça-feira o julgamento dos recursos dos dois vereadores, cassados por, supostamente, receberem doações ilegais da Associação Imobiliária Brasileira (AIB) na campanha de 2008.

De acordo com o TRE, os juízes que votaram hoje favoravelmente aos vereadores defenderam a tese de que a ação deveria ter sido proposta no prazo de 15 dias contados da diplomação dos eleitos. Os juízes que votaram retirando a cassação e a inelegibilidade dos eleitos foram Flávio Yarshell e Paulo Henrique Lucon, além do desembargador Penteado Navarro.

A Justiça Eleitoral já cassou 24 vereadores paulistas da atual legislatura por irregularidades no recebimento de doações nas campanhas políticas. No entanto, todos continuam exercendo seus cargos apoiados por um efeito suspensivo judicial. Eles aguardam serem julgados pelo TRE.

O mesmo juiz que cassou os vereadores, Aloisio Sérgio Rezende Silveira, também determinou a cassação do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, e de sua vice Alda Marco Antonio. Ambos recorreram da decisão e conseguiram o efeito suspensivo. Agora, também aguardam o julgamento do TRE.

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