MARLAN ROCHA: MORRE O ESTADO DO RIO SÃO FRANCISCO
Qual será o sentido da vida: nascer, crescer, se
reproduzir e morrer? Ou quem sabe plantar uma árvore, escrever um livro e
ter um filho? Se forem somente estes os motivos, a passagem de Marlan
Rocha pela terra não teria sido em vão. Mas pelo contrário, podemos ter a
certeza: 75 anos foi muito pouco tempo para aquele grande homem.
Ele não só deu imenso sentido a sua própria
existência, nos concebeu o direito de sonhar, sonho este de vida melhor,
de justiça social, igualdade, fraternidade ou simplesmente, viver
dignamente e quando, amparado num novo estado da federação.
Barreirense nato da “beronha” do Rio Grande, Marlan
fez o primário na Escola Costa Borges e no Colégio Padre Vieira. Já no
Rio de Janeiro conclui o ginásio no Colégio Juruena e logo depois, se
graduou numa das melhores escolas de administração da América Latina, a
Fundação Getúlio Vargas.
Trabalhou na transição do antigo IBRA - Instituto
Brasileiro de Reforma Agrária, para o que hoje é o INCRA. Neste período
foi encarregado de organizar o novo órgão entre a Bahia e o Paraná, onde
multiplicou sua paixão pela nossa terra e peloo povo brasileiro, em
especial, a paranaense Terezinha Rocha, com quem se casara.
Marlan atuou no IBAMA, foi Assessor da Secretaria de
Planejamento do Estado do Maranhão, trabalhou no Governo de São Paulo, e
participou ativamente na instalação administrativa do recém criado
Estado de Rondônia.
Ele era uma verdadeira biblioteca ambulante: Dante
Alighieri, Guimarães Rosa, Karl Marx, Castro Alves, Vitor Hugo e tantos
outros, pareciam viver balbuciando aos ouvidos daquele homem.
Sua paixão pela literatura nos garantiu a instalação
da 1ª biblioteca pública de Barreiras (hoje na Praça Amphilofio Lopes),
que leva o nome de seu irmão querido, o também genial professor Folk
Rocha.
O Parque de Exposições Agropecuário Geraldo Rocha, em
Barreiras, foi resultado de seu trabalho em convencer Dr. Orlando de
Carvalho a doar o terreno para construção, provando assim, sua
habilidade política e visão futurista. Porém, no ato de inauguração do
Parque, seu verdadeiro idealizador, Marlan Rocha, nem se quer convidado
fora.
Ele dizia sempre que o desenvolvimento de uma nação
passa prioritariamente pela educação de sua gente, e por isso, trouxe
para cá a 1ª Escola Técnica, dando-nos a capacitação necessária para
contribuir decisivamente na transformação da nossa região num dos
maiores celeiros agrícolas do Brasil. A Agrotécnica Geraldo Rocha foi
parte de um mega projeto desenvolvido por ele em 1973, que incluiu
ainda, a instalação dos primeiros projetos de irrigação no vale, pela
CODEVASF.
Certa vez, Marlan trouxe a Barreiras, escoltado por
um policial Federal, que desconhecia a identidade do passageiro, o
lendário deputado Chico Pinto, de quem o senador Pedro Simon chamou de,
“um puro, um digno”. Marlan quando fez política eleitoral rodeou-se de
pessoas da mais alta estirpe moral. Integrou a ala denominada de “Os
Autênticos”, alcunha dada pelo Jornalista Carioca Evandro Paranaguá, ao
grupo político dos que defendiam os direitos humanos e a soberania
nacional durante a Ditadura Militar na década de 70, no Brasil, e que
faziam parte do velho MDB, hoje o “morto-vivo” PMDB.
Getulista convicto, Marlan foi candidato a deputado
estadual, e nunca foi querido entre a “grande classe política local”,
não por sua controvérsia, genialidade ou “ríspida” moral, mas por ter
sido livre, independente ideologicamente e financeira, que pensava por
si só, ou simplesmente, por não bajular o poderoso da hora em busca de
ganhos pessoais! Pois nesta terra, não agradar ou criticar publicamente
um político é motivo para todos os infortúnios, até o desaparecimento
físico.
Mas, seu maior feito foi à inclusão do projeto de
criação do Estado do Rio São Francisco na Assembléia Nacional
Constituinte de 1987/88. Ele convenceu nada mais, nada menos que, 171
deputados a endossar sua causa, ou seja, um terço da Câmara Federal, e
isso não deve ter sido nada fácil, diante todo aquele conturbado momento
de reinstalação da democracia no Brasil.
Marlan enfrentou o Estado da Bahia e seus
representantes que sempre foram contra, confrontou o projeto do novo
Estado de Cabrália que, incluía boa parte de nossas terras, expulsou o
Pernambuco que desejava a devolução desta área, e ainda “de quebra”,
convenceu o Senador Pernambucano, Mansueto Lavor, a fazer parte de sua
causa mesmo que, inviabilizasse os projetos dos pernambucanos e dos
“riosãofranciscanos”. “Marlan Rocha foi o herói do exército de um homem
só, o nosso verdadeiro Simom Bolívar”.
Mais de 20 novos estados brasileiros tentaram e
tentam nascer desde a nova constituição, todos estes tinham e têm seus
líderes políticos: dezenas de senadores, centenas de deputados federais e
estaduais, e milhares de prefeitos e vereadores, porém, o Estado do Rio
São Francisco tinha Marlan Rocha, que valia e sempre valeu mais que
todos os nossos representantes políticos da região juntos, e olha que
ele nunca teve mandato algum, era somente ele e ele mesmo.
Por isso, adiciono à afirmação do conceituado
Pós-Doutor em Geografia pela Open University da Inglaterra e professor
da Universidade Federal Fluminense, Rogério Haesbaert da Costa, que
garantiu em 1996, que Marlan Rocha era “o principal articulador do
movimento Pró-Criação do Estado do Rio São Francisco”. Mais do que isso
“Seu Dotô”: ele foi o sonho, o nome, as cores, a bandeira, o hino, o
brasão. Marlan era o próprio Estado do Rio São Francisco.
Contudo, ele não deixou de ser o filho, o irmão, o
tio e o pai. O livro, a biografia de Geraldo Rocha; Os filhos: Folk,
Augusto, Juliana e Camila. A árvore: o Estado do Rio São Francisco.
E agora, quem empunhará a bandeira pelo nosso Estado?
Quem fará o lobby do bem em Brasília? Quem no front abdicará dos seus
mais íntimos interesses políticos e pessoais, e com a faca entre os
dentes desafiará o novo/velho governo da Bahia contra este desgoverno?
Quem de coragem dirá: “Wagner, já se passaram três anos, você nos pediu
apenas dois, e agora? Não será esses políticos (a) que aí estão! Até por
que, onde estiveram todos (a) nestes últimos 22 anos?
Mestre Marlan, meu muito obrigado por tudo, vá em paz. Pois daqui, “sempre lhe contarei uma vantagem”.
Concluo meus amigos e amigas, desejando-lhes Feliz
Natal e um 2010 cheio de saúde, paz e alegrias. Deixo apenas as sabias
palavras de Geraldo Rocha: “... O povo que ainda produz loucos desta
espécie, tem direito de conservar esperanças de ver realizado o milagre
da ressurreição”.
Por Fernando Machado
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