|
Desenrola-se
em nosso tempo uma luta formidável entre duas forças antagônicas. Os
que desejam uma mudança profunda em nossa maneira de viver, em que o
homem se torne mais livre e, portanto, mais capacitado para amar e os
que desejam manter o “status quo” presente em favor dos valores que
defendem.
Os que lutam por mudar pacificamente são em quantidade
mais fracos, porém, mais conscientes. A consciência daquilo que desejam é
a grande arma de que dispõem.
Os adversários das mudanças
combatem em nome da “democracia”, da “ordem”, da “propriedade”, da
“religião” etc., mas ainda que, sinceros e convencidos desses valores,
recusam-se obstinadamente e irracionalmente a aceitar a crítica de que
não temos essa vivência real.
Há uma terceira força. Essa é a
força do desespero e do ódio. Os engajados nesse quadro aparentam uma
grande coragem. Entretanto, não resistem a uma análise mais profunda e
objetiva. Revela em muitos não um destemor para enfrentar a morte, mas
sim um medo de viver e um sentimento antivida. Essa força do
desequilíbrio, certamente encontra-se inserida em nosso contexto social.
O
homem do nosso tempo não sofre frustrações comuns à era vitoriana. A
frustração do homem moderno é uma frustração existencial. Isto porque
todo o impulso que o levaria a uma plenitude vivencial é barrado e
canalizado para outras direções, conforme determina a estrutura social.
Hoje
poderíamos falar em determinismo social — o homem vale como peça da
sociedade e é parte ativa construtora e mantenedora do esquema
produção-consumo.
A problemática atual, o homem e a sociedade, ao contrário do que se pensa, é profundamente vinculada à ideia religiosa.
A
religião, ou mais especialmente, líderes religiosos estão fecundando
todas as atividades humanas de um novo humanismo. Vemos brotar em toda
parte os ideais de fraternidade e renovação social. Somente por essa
atuação constante, corajosa e essencialmente amorosa que a humanidade
fará juz à assertiva messiânica: “Bem-aventurados os mansos e pacíficos,
porque herdarão a Terra”.
O Espiritismo se acha também fecundado
desse novo humanismo. Kardec aceitava esse humanismo não como uma
propriedade exclusiva da Doutrina dos Espíritos, mas como um movimento
renovador que estaria em toda parte: “A nova geração marchará, pois,
para a realização de todas as ideias humanitárias compatíveis com o grau
de adiantamento a que houver chegado. Marchando o Espiritismo para o mesmo objetivo (1) e realizando suas finalidades, ambos se encontrarão sobre o mesmo terreno”. (2)
É
curioso notar que Kardec aceitava uma espécie de “determinismo de
renovação” para a humanidade: “Não é o Espiritismo que cria a renovação
social, “é a natureza da humanidade que faz de tal renovação uma necessidade”.
(3). Assim, para Kardec, se o Espiritismo realizar suas finalidades
encontrará o movimento de renovação espalhado nas atividades humanas, sobre o mesmo terreno.
Toda renovação há de ser em essência e não na aparência. Então, devemos começar pela base.
Qual
a base do movimento espírita em nossa atualidade? Sem dúvida alguma, as
instituições espíritas. Essas instituições devem, portanto:
—
Primar pela justiça social em seus próprios quadros, àqueles que
trabalham devem receber remuneração condigna e participação democrática
nas decisões que dizem respeito às suas tarefas;
— Desenvolver a liberdade humana, respeitando todo direito de crença e política do assistido ou funcionário;
— Promover a hierarquia natural ou burocrática, no sentido de engrandecer os comandados e não amesquinhá-los;
—
Transformar as tarefas existentes em trabalho de equipe, aceitando a
opinião de técnicos e entendidos, seja nas realizações comuns ou nos
empreendimentos maiores;
— Substituir a fé simples da
aceitação de decisões tomadas por espíritos-guias nas sessões da casa
por, primeiramente, reuniões de cooperadores e funcionários e, depois,
então o diálogo franco e leal com os espíritos, quando a razão
prevalecerá na aceitação desta ou daquela sugestão do plano espiritual.
Essa
reformulação nas instituições espíritas é imperiosa (... “se não
fizerdes mais do que os gentios que mérito tereis?”), tão imperiosa que
poderá mesmo depender em grande parte para a preservação do movimento
espírita.
Ao espírita cabe também a grande opção: o conformismo
mantenedor do “status quo”, o inconformismo improdutivo, gerador de
reações violentas, ou a busca da plenitude existencial que compreende um
programa de excursão na complexidade do eu; uma atitude corajosa ante a
injustiça social; uma desafiadora fuga à escravização da posse
exclusivista; um domínio sobre si próprio ante o condicionamento
manipulador de emoções dirigido por elites dominantes; um esforço
verdadeiro, sem fanatismo, para dominar tendências menos sadias; um
desejo real para viver — com um real sentimento de felicidade por
existir.
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário