A Peçonha
da Língua, Ante os Três Filtros Socráticos
Jesus advertiu
sobre a contaminação oriunda das substâncias que saem da boca humana. Quem
promove a disseminação da maledicência, invoca o distúrbio para si mesmo.
Por isso, urge vigiar e domar o vício do falatório, do comentário maldoso –
por que não dizer: “fofoca”? Quem se afirme espírita, não pode esquecer
que os censores do comportamento alheio acabam, quase sempre, praticando as
mesmas ações censuradas.
Lamentamos o clima
de comprovada invigilância deixada pelas peripécias do ânimo impiedoso dos
caluniadores, com suas mentes doentias, sempre às voltas com a emissão
impetuosa do fuxico generalizado. Confrades, esses, que engendram entusiasmos íntimos,
ante as dificuldades e eventuais deslizes do próximo. Assestam a volúpia da
detração, com acusações infames, de realidades que desconhecem em
profundidade, sempre em direção das angústias e lutas íntimas dos que tentam
se erguer de um erro cometido.
Comprazem-se no
mexerico e na satisfação de verem um irmão sofrendo uma experiência mais difícil.
Dissimulam, no velho chavão "vamos orar por eles!!", o aguçamento
dos quesitos de suas perfídias.
Esquecem-se que o
falatório induz à fascinação, secundando o desequilíbrio emocional,
impelindo-os aos processos obsessórios. Muitos irmãos lhes são alvo de açodadas
e contundentes críticas, onde os princípios evangélicos são arremessados
para as calendas. Se praticassem o bem, escutariam, no recesso da consciência,
a advertência inserta no cap. 1, versículo 26, de Tiago: “Se alguém
cuida ser religioso e não refreia sua língua, sua religião é vã".
(grifamos)
O Apóstolo dos
gentios registra, aos romanos, a seguinte admoestação: “Sua garganta é
um sepulcro aberto; com a sua língua trata enganosamente, peçonha de áspides
está debaixo dos seus lábios.” (grifamos)
Certo
orador, médium psicofônico, gostava de trabalhar em um determinado Centro.
Realizava todas as suas tarefas doutrinárias com tal cuidado, com tal senso de
responsabilidade, que não tardou ser eleito Dirigente de um Departamento da
instituição. Novos desafios a vencer, algumas coisas para aprender, outras
tantas para reformular... Ao final de uma etapa de trabalho, foi visitar o
Presidente do Centro. Após breve diálogo, apresentou seu Relatório das
atividades. O Presidente agradeceu e já ia abrindo, quando o novo Dirigente do
Departamento começou a falar:
-
Sr. Presidente, tenho que fazer algumas modificações na minha equipe de
colaboradores, porque o Assistente que me indicaram, imagine o Sr,
contaram-me...
Antes
que terminasse a frase, o Presidente, lembrando o filósofo Sócrates,
interrompeu:
-
Espere um pouco, meu irmão. O que pretende me contar, já passou pelos três
filtros?
-
Filtros! Que filtros, Presidente?
-
Primeiro, o filtro da VERDADE. Você tem certeza de que esse fato é,
absolutamente, verdadeiro?
-
Não, não tenho. Como posso saber? O que eu sei é o que me contaram. Mas eu
acho muito grave que...
O
Presidente interrompe novamente:
-
Então, a sua história já perdeu substância, ou seja, não passou no primeiro
filtro.
-
É... mas...
-
Vamos para o segundo filtro, que é o da BONDADE. O que você deseja me
informar, traz algum benefício a alguém? Você gostaria que dissessem o mesmo
a seu respeito?
-
Claro que não, Presidente, Deus me livre! Nem poderiam falar uma coisa dessas
de mim, que sou...
-
Então, meu filho, sua história fica um pouco mais fraca, porque não passou no
segundo filtro, por suas próprias palavras.
-
Porém, ainda resta o terceiro filtro, que é o da NECESSIDADE. Você acha,
mesmo, que há necessidade de me contar o que pretende? Esta história – que
ignoro - sobre o seu Assistente, que é seu confrade de fé, seu companheiro de
trabalho, merece ser comentada, ou você pretende conquistar público que o
aplauda, ao comentá-la? Pense bem, meu caro. Uma vez tenha, eu, tomado ciência
de algum fato que me obrigue a agir, visando o bem da Instituição e de todos,
tenha certeza de que não hesitarei em tomar as providências cabíveis.
-
Não!... Sr. Presidente, passando pelo crivo destes três filtros, concluo que
nada sobra do que eu iria lhe falar, diz o Dirigente, surpreso consigo mesmo.
As
pessoas seriam mais felizes se todas utilizassem esses três filtros, antes de
divulgarem suas suspeitas a respeito de alguém. Antes de obedecerem ao impulso
da difamação, reflitam, porque serão, inexoravelmente, reconhecidos desta
forma, ou seja, como cruéis difamadores.
Quando
não filtramos nosso parecer a respeito do próximo, é evidente que os
elementos psíquicos que verbalizamos são potencialidades que atuam contra nós
mesmos. Do campo mental aos lábios, podemos manter absoluto controle. Um
pensamento negativo pode ser substituído, de imediato, ao passo que a palavra
solta é sempre um instrumento ativo em circulação. Não se pode, nesse
contexto, compreender uma atitude espírita conivente com um comportamento que
é atentatório ao conteúdo moral do Espiritismo.
Aos
devotos da fuxicaria contumaz, os impertinentes ajuizadores de valores morais
alheios, atentemos para uma lição de Chico Xavier: “Numa viagem de mil
quilômetros, não nos podemos considerar vitoriosos senão depois de chegarmos
à meta almejada, porque nos dez últimos metros, a ponte que nos liga ao ponto
de segurança pode estar caída e não atingiremos o local para onde nos
dirigimos.”
Finalmente,
não esqueçamos que a palavra constrói ou destrói facilmente e, em segundos,
estabelece, por vezes, resultados gravíssimos
para séculos.
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