sexta-feira, 15 de junho de 2012

A inveja

A inveja e o bicho


Inveja é uma coisa danada. Acho que a pessoa não sabe muito bem como ela vai chegando, aí ela se instala, vai crescendo e crescendo lá dentro, cada ação e não ação do objeto da inveja vai sendo interpretado como afrontas e ofensas pessoais ao invejoso, mesmo que o objeto da inveja mal se interesse pelo que o invejoso pensa ou sabe de sua existência. Na mente do invejoso provavelmente passa meio que subconscientemente um “Afinal de contas, como o objeto da inveja ousa ter ou ser aquilo que ele admira ou não suporta ver realizado pelo e no outro?

A inveja é até mesmo considerada um dos sete pecados. E também tem muito a ver com intolerância, não? A impossibilidade de haver alguém diferente daquilo que pensamos como ‘o certo’ é insuportável. Mas, enfim, quando esse bicho cresce lá dentro, aí é que o bicho pega mesmo. As barreiras morais se desfazem, e as ações e linguagem se rebelam, saem da serenidade e se tornam armas ferinas que não se importam em inventar, criar estórias, caluniar. Talvez nada disso seja nem mesmo percebido já que uma característica de quem deixa o bicho crescer é não perceber nada mesmo.

Tenho uma amiga que nos seus tempos de faculdade foi escolhida, por seus méritos, a ser assistente da professora. Ela monitorava a turma que ficava de recuperação. E não deu outra, ~ sempre tem alguém em quem o bicho pegou ~ uma aluna que ficou de recuperação encrencou com ela, a tal era bonita, inteligente, não tinha ficado de recuperação e ainda tinha virado assistente da professora! Que ultraje! E aí começou a espalhar que essa amiga usava drogas, crack, etc., até que a coisa chegou na diretoria! Não é incrível? Quando o bicho pega, a pessoa perde a razão. O Buddha dizia que era como alguém que pegava uma ponta de um bastão que tinha sido enterrado no esterco e nem se importava com isso.

Quando Sakka veio falar com o Buddha, ele perguntou: “Bem Aventurado, todos os seres desejam ser livres da raiva e da malevolência. Eles não querem disputar, nem ser mal tratados, mas oram por felicidade, segurança, paz e liberdade. Ainda assim, eles não se veem livres do perigo e do sofrimento. Qual é a causa para isso?

E o Buddha respondeu: “Todos os seres vivos almejam a felicidade, segurança, paz e liberdade. Ainda assim, eles não se veem livres do perigo e do sofrimento. Esta condição infeliz se deve aos grilhões da inveja e da avareza”.

Está aí, o Buddha resumiu a origem das raivas, ódios e maledicências: a inveja e a avareza.

Inveja o Buddha chamava de issā e é a “aversão pela prosperidade e bem-estar dos outros. Essa aversão os torna maliciosos e destrutivos”. O invejoso pensa sempre que está correto, suas distorções mentais são interpretadas por ele como verdades, afinal, seu objeto de inveja (ou seria de admiração velada?) tem o que ele não tem. Claro, é uma ilusão da mente. Mas a felicidade ou prosperidade do outro é vista com ressentimento. Na classificação do Abhidhamma buddhista, a característica da inveja é o ressentimento pelo sucesso do outro. Sua função é tornar a pessoa invejosa miserável. Sua manifestação é fechar os olhos em relação à prosperidade do outro. “Um homem poderoso buscará arruinar a pessoa que ele inveja”. Felizmente há uma cura. Aqueles que atacam, agridem e caluniam podem fazer uso da virtude de muditā, a ativa expressão de alegria pelo sucesso do outro. Aos poucos, se eles se esforçarem, seu ódio acalmará, sua mente ficará mais clara, e quem sabe até possam perceber que seu objeto de inveja pode ser um amigo, ou pelo menos uma pessoa legal para se conversar de vez em quando.

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